domingo, 5 de agosto de 2012

Os pacientes começam a retornar


Na sexta, já tive dois pacientes. Um deles é novo, mas o outro, de longa data. Quando eu atendi a porta, tomei um susto vendo um militar.
— Doutor Karl?
— Sim? — O fato do cara estar fardado, me assustou, mas o uso do doutor foi um fator tranquilizante.
— Não está me reconhecendo?
— Não tenho a menor idéia de quem é o senhor.
— Nem tendo me atendido por três anos?
Olhei bem para o cara, mas continuei sem a menor idéia de quem era. Tive que esclarecer a minha situação.
— O senhor sabe por onde estive nos últimos cinco anos? — Perguntei.
— Sei. Na cadeia, preso por ter acertado o Marechal Florin num duelo de pistolas.
— É, mas foi só um tiro em seu glúteo esquerdo. Não tenho culpa se ele gastou a sua única bala e depois se virou para fugir. O Marechal poderia ter morrido de uma forma mais digna, com um tiro no peito ou na barriga. Além do mais, nunca vi alguém morrer por causa de um tiro na bunda.
Olhei para o cara e fui logo para a questão.
— Quer uma consulta ou veio me prender?
— Consulta.
— Então entra.
Resulta que o cara estava querendo sair do armário mas não estava com coragem para enfrentar os seus companheiros de arma.
Na hora encrenquei com a estória dos companheiros de armas.
Será que eles ficam lutando espada no escuro? — Mas resolvi não aprofundar a questão e deixei que continuasse.
Fiquei de lero-lero com o cara para ver se ele se identificava, mas não disse o seu nome, e nem eu perguntei.
— Quanto foi?
— Duzentos dólares.
O cara ficou meio branco. Eu tentei melhorar.
— Paga em leu. — Para quem não sabe, leu é o plural de lei, que é a moeda romena.
— Então, é quanto?
— Hum… Oitocentos leus.
Ficou mais branco ainda.
— Não tenho.
— Quanto é que você tem?
Contou na carteira e fez olhar de bunda.
— Trezentos e trinta e sete.
— Serve — e estendi a mão.
Foi-se. E eu, depois de cinquenta minutos de sessão, confesso que não me senti muito culpado de ainda não ter a menor idéia de quem era o cara.

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