O Horácio não gostou quando lhe disse que ia colocar uma placa no hall do edifício.
— Isto aqui é um prédio residencial, e não há possibilidade de colocar nada na portaria.
— Au contraire. Eu tenho o direito disto. A minha profissão é legal, e nada me impede de exercê-la em casa.
— Começa que o seu diploma é fajuto. Depois, eu não quero e o apartamento é meu.
— Mein Gott! E a liberdade de expressão onde é que fica? E a livre iniciativa?
— Não vai botar e está acabado — e se mandou.
É claro que eu botei.
De noite, quando chegou, estava soltando labaredas.
— Tudo bem de você colocar a placa, mas Psicanalista de Madame? Ficou maluco?
— Uai, eu tenho uma tendência hetero, você sabe.
— Claro que eu sei. A testosterona vaza pelos seus ouvidos.
— E daí que eu só quero mesmo é madame.
— Ficou doido? Você tem que tratar de todo mundo!
Eu não queria discussões e então topei trocar a placa.
Dia seguinte, a mesma estória.
— Porra, Malak, você ficou maluco?
— Eu? Porque?
— Psican-ANAL-ista?
— É.
— Como assim, é?
— Tudo acaba lá.
— O quê?
— Psicanálise, comida, temperamento, ansiedade, retenção, pão-durice, desejos inconscientes…
— Engraçadinho. Pois você vai mudá-la.
— Esta coisa está me saindo a maior grana. — E lá fui eu trocar a placa novamente.
— Não entendi nada.
— Lá vem você de novo. Se não entendeu nada, não pode reclamar.
— O que é que está escrito ali?
— Psicanalista, em russo.
— Então, qual é o sentido?
Era tão óbvio.
— Meu caro amigo, é que nem a Psicanálise.
Frente a seu olhar de bobo, completei, entediado.
— Sentido, Horácio. Não tem sentido algum.
E a placa ficou.
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